segunda-feira, 6 de agosto de 2007

O ESPANTALHO DE FANTASMAS






(Odilon Trindade – 03/7/2003)


O galo é um animal místico, ou pelo menos para mim é.
Na minha infância, os meus medos se intensificavam, principalmente, quando me via desperto, sozinho, mergulhado na escuridão da noite. À minha volta, todos dormiam e eu suava frio. Respirava discretamente, apenas para não morrer sufocado. Algo me dizia que um fantasma havia marcado encontro comigo para aquela noite. O pavor rondava meu leito como se, de um momento para outro, fosse explodir em macabros acontecimentos.
Todas as noites, após o jantar, meu pai e meus tios se reuniam e contavam histórias. Deve ter sido numa dessas conversas onde ouvi que os fantasmas não mais apareciam depois do galo cantar. Por isso, nas minhas noites de terror, eu ficava na torcida para que ele cantasse o quanto antes. Quando cantava, era um alívio ouvir sua cantiga. Acabava-se o martírio. Então eu poderia dormir com segurança. E dormia.
Nós tínhamos um galo que andava solto pelo terreiro junto com as galinhas. Um dia calamitoso ele voou até o alto de cerca, cantou e resolveu pular além do terreiro, para a rua. Sua liberdade não durou. Um caminhão deu fim na sua existência.
E agora? – pensei - Meu espantalho de fantasmas havia morrido.
Veio a noite, tétrica e sem luar. Ela vestia a túnica mais escura que possuía em seu roupeiro. Estava assombrosa.
Por todos os meios tentei manter, no máximo, os meus familiares acordados. Água, tomei mais de cinco copos. De vez em quando eu gritava que estava com sede. Febre, pensou meu pai. Constatada a farsa, mandaram-me dormir. Afinal, eu estava enchendo a paciência de todo o mundo.
Fechei os olhos e tentei me convencer de que era apenas uma questão de insegurança pela falta do galo. Não vi, nem lembro como, mas adormeci. Lá pelas tantas - maldita hora - me acordei com um estalido qualquer. Deveria ser daqueles da própria madeira se acomodando. Mas isto eu sei somente hoje. Naquele tempo, era o sinal do fantasma. Como já me haviam repreendido, não poderia mais pedir água. Só me restou então uma saída: sentei na cama e cantei de galo a todo peito.

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